Thursday, August 16, 2007

Artesãos da cultura


Finalmente o autocarro que vai apanhar o teatro está em marcha ao longo do Algarve. Mas, apesar dos problemas técnicos que atrasaram este teatro rolante, os actores do Vamos Apanhar o Teatro (VATE) já tinham palmilhado as escolas do Algarve mais recônditas para levar a magia do teatro às crianças das escolas do 1º ciclo. Desta vez, foi a vez dos actores crescidos verem como se portaram os actores de palmo e meio, com direito a auditório José Louro.
“-Agora é a vossa vez”. A voz de Jorge Soares soou como um preparativo para o presente que os alunos da Ilha da Culatra e da escola de Pontes de Marchil tinhampreparado para oferecer à equipa do VATE. Numa primeira fase esta equipa foi às escolas, com o palco às costas, levando com ela o espectáculo Rapsódias e Lobices e um repto: vamos ensinar-vos como se fazem os bonecos e daqui a dois meses voltamos. Depois queremos ver o vosso espectáculo. Dia 28 de Abril foi o dia destes alunos mostrarem o seu empenho na criação de bonecos e nas suas dramatizações. O encontro foi na escola básica das Pontes de Marchil. Depois de se combinar o alinhamento do espectáculo - que escola iria apresentar primeiro e por que ordem - os alunos encaminharam-se para o autocarro que dá vida aos sonhos, o autocarro do projecto “Vamos Apanhar o Teatro”. Recebidos pela Luísa, a técnica que conduz o autocarro, os alunos instalaram-se no auditório José Louro. Os alunos da Ilha da Culatra fizeram os seus ensaios de adaptação ao espaço para depois apresentaram os seus presentes em forma de dramatizações à equipa do VATE e aos seus colegas das Pontes de Marchil. Primeiro, Jorge Soares conversou com os pequenos actores, mostrando-lhes os segredos do auditório ambulante. Os camarins, a plateia, o palco, eram palavras que, apesar dos alunos as conhecerem e saberem aplicar, não diminuíam o brilho nos seus olhos quando pulavam para cima do palco ou quando viam um projector apontado para um boneco. Feitas as apresentações começaram as actuações dos alunos da Culatra. E aquilo que se viu eram pedacinhos de algo grandioso do ser pessoa, do ser cidadão. As três apresentações que aqueles alunos ofereceram à equipa do VATE eram histórias sobre a amizade e a capacidade de inter-ajuda. As histórias surgiram a partir dos bonecos. Uma era sobre uma girafa que fazia amizade com uma cobra, outra era sobre duas meninas que brincavam e uma ajudava a outra para não se sentir triste. Dava-lhe mesmo a possibilidade de partilhar a sua família, ilustrando a generosidade de que as crianças são exímias. A última apresentação teve como estímulo os bonecos executados pelos alunos. Estes inspiraram-se nas cegonhas e nos seus batimentos com o bico na altura do acasalamento. Cantaram com as cegonhas, fazendo os bonecos executados em cartolina soar de forma idêntica àquelas simpáticas aves mediterrânicas. Acabada a função, felizes pelo seu desempenho foi a vez dos meninos de Marchil mostrarem o seu trabalho aos colegas. A apresentação foi feita na escola para todos os colegas: os que participaram neste projecto e também para os mais pequeninos. O espectáculo chamou-se “A Chegada da Primavera”. Tinha um cenário que ia mudando ao longo de uma canção interpretada pelos alunos. À medida que a Primavera ia chegando e o cenário se ia enchendo de cor, folhas verdes, borboletas, pássaros e flores, também iam chegando os pequenos actores com figurinos construídos nas aulas, fruto de uma sensibilização não só para a expressão dramática mas também para a expressão plástica.
Depois dos alunos das duas escolas terem convivido e trocado experiências durante o almoço divertiram-se com o espectáculo de Robertos interpretado por Jorge Soares. Os seus olhos brilhantes, no meio do riso das peripécias do “Burro Teimoso” irradiavam uma felicidade genuína. Quando se perguntou a estes meninos o que queriam ser quando fossem grandes muitos foram os que disseram polícia! Bombeiro! Mas também houve um menino que disse: quero ser o homem dos bonecos, como o Jorge. Outra menina, de grandes olhos claros afirmou querer ser actriz, como a Tixa, para andar no autocarro a brincar com os meninos.
Ao longo deste processo estas crianças estiveram atentas, assistiram em silêncio a todas as propostas dos colegas e participaram directamente quer na concepção das histórias como na elaboração dos bonecos, dos cenários, dos figurinos. Mais que uma animação que podem guardar no seu cantinho onde habita o efémero estas crianças tiveram oportunidade de construir o seu próprio espectáculo. É este movimento de vai e vem, em que se aprende com prazer, que a ACTA está a proporcionar aos alunos das escolas do 1º ciclo do Algarve. O autocarro vai continuar a rolar e, quando menos esperar, uma criança chegará com os olhos a brilhar, dizendo que nesse dia fez um espectáculo para actores de verdade e que entrou dentro de um autocarro que era um teatro. Nessa altura o autocarro chegou a uma escola perto de si.

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